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Da função mercantil a lugar de culto
Laboriosamente erguido, o açougue viria a alcançar tal magnificência que D. Luís resolveu dar-lhe outro destino mais conforme ao seu brilho e às suas dimensões e ao próprio local escolhido para implantá-lo. Em carta remetida de Lisboa às autoridades concelhias, a 17 de Maio de 1550, ofereceu-a à Confraria da Santa Casa da Misericórdia, de que era protector, para a instalação da respectiva igreja. Fundada pelo rei D. Manuel em 1500 e protegida pela oligarquia de Beja, a Confraria da Misericórdia tornara-se a mais importante corporação assistencial da cidade. Porém, à míngua de instalações autónomas, continuava a reunir-se na igreja de Santa Maria da Feira; o facto de passar a ter sede no edifício de maior destaque da Praça Grande, graças à munificência ducal, fala por si mesmo.
Se é certo que a obra estaria praticamente concluída, a mudança de função levou a acrescentar-lhe uma terceira nave transversal, para a instalação do altar-mor, e ao entaipamento com alvenaria dos espaços entre as arcadas exteriores da galilé, que passou a ser rasgada em cada um dos panos por três portas, rematando-se o pano central da fachada com um frontão. Estes trabalhos decorreram com rapidez e, nos termos de um projecto aprovado em 1553, abrangeram também a implantação de três capelas na face do presbitério, a capela-mor e duas às suas ilhargas. O edifício assim modificado corresponde a uma tipologia, característica das igrejas da Misericórdia, em que o espaço reservado à capela-mor surge bem demarcado pelo pavimento mais alto, separado por degraus. Se a galilé primitiva constitui um caso praticamente único, em Portugal, dentro da arquitectura civil do Renascimento Tardio, a junção da nave transversal evidencia não só outras proporções mas também um diferente sistema de abobadamento e suporte. Quanto às naves primordiais, acabam por assumir uma funcionalidade muito similar às das hallenkirchen. Do confronto da harmonia inicial daqui resultante brota um novo pendor espacial que podemos caracterizar, dentro das suas ambiguidades, como sendo verdadeiramente proto-maneirista – algo muito de acordo, já o vimos, com a trajectória artística de Diogo de Torralva.
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