A
única coisa sobre a qual temos a certeza enquanto vivos, é que um
dia morremos. Mas curiosamente a morte é um tema que nos mete um
medo... de morte. É um tema que, por norma, nem em brincadeira é
bem-vindo.
Vítor
Encarnação, na sua crónica no Diário do Alentejo “Nada mais
havendo a acrescentar” desta semana trata a morte por tu.
Com
a devida vénia a transcrevo:
«Quando
eu morrer quero o caixão fechado, nunca gostei que me vissem quando
estou deitado, a única diferença é que já não estou vivo, mas
isso pouco importa, a privacidade é a última coisa a morrer, não
quero que mais ninguém olhe para mim, sei lá quem é que olha para
mim, um e outro, uma e outra, a entrarem com pêsames na boca e
flores nas mãos casa mortuária adentro, a verem-me a dormir para
sempre, a mirarem o que resta de mim e eu aqui sego de de vida, a
espreitarem a rosto frio, a tocarem o rosto frio que nunca mais
haverá de aquecer, nunca mais haverá beijo nem mãos que me aqueçam
o rosto. Imagino o que está a acontecer, já aqui estive tantas
vezes neste sítio para onde eu sabia que vinha, era um a questão de
tempo, ninguém escapa, há flores em volta do caixão, há duas
lâmpadas acesas a imitar velas, uma de cada lado do meu desmedido
silêncio, as mulheres estão cá dentro, os homens estão lá fora,
eu costumava estar lá fora, agora estou cá dentro, cada velório é
um treino para a nossa própria morte, há de haver um dia em que
chega a nossa hora. São horas de espera, para vocês, para mim não
tanto, tenho agora todo o tempo do outro mundo. A notícia da minha
morte é pública mas a minha morte é minha, é uma coisa íntima,
pertence-me, faço dela o que eu quiser, vês-me tu, vê-me tua mãe
e chega.»
Foto:
Jornal O Povo
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