Quando
se conta uma história constrói-se um universo e convida-se o
público a habitá-lo. A partir do plano construído pelo conto,
espera-se despertar o espetador para edificar o seu próprio
universo, ou seja, a sua própria interação texto-leitor.
Para
crianças que ainda não foram alfabetizadas, ou não tiveram
contacto direto com o texto literário, a narração de histórias
funciona como um mediador de leitura situando-se entre o texto e o
leitor, facilitando a relação que deve existir entre eles.
É
sabido que crianças que tiveram contacto com a literatura antes de
serem alfabetizados têm muito mais chances de se tornarem leitores
assíduos. Seria realmente maravilhoso se a arte da narração de
histórias estivesse presente nas escolas, pelo menos no primeiro
nível do ensino básico. No entanto o que se observa é que a
burocracia e o sistema avaliativo matam a parte humanizadora e
artística da literatura, destroem todo o encantamento que habita os
contos de fadas.
Diante dos números que devem apresentar, os
professores acabam presos a uma forma de avaliação que considera o
texto literário apenas para extrair e exemplificar aspetos
linguísticos e gramaticais, ou para interpretações que não
alcançam o sentido profundo do texto e não permitem a construção
de um novo sentido.
Diante
das dificuldades de trabalhar o lado lúdico e artístico da
literatura sem deixar de lado a parte avaliativa, cabe-nos questionar
até que ponto se pode tornar didática a literatura ou a narração
de uma história. Se considerarmos o ideal da interação entre texto
e leitor para a construção de um novo sentido e decidirmos que
vamos trabalhar essa capacidade, é possível chegar a algumas
possibilidades. Exercícios como recontar a história, criar uma nova
história partindo da história contada, conversar sobre outros
desfechos ou inserir um elemento desestabilizador no enredo, são
algumas ideias que permitem que o espetador/leitor construa a sua
própria imagem, o seu próprio sentido, sem deixar de lado o
significado que o texto traz.
É
preciso confiar na capacidade do leitor em potencial, porque é isso
que são todos aqueles que ouvem uma história: Leitores em
potencial! É preciso deixá-los construir relações e sentidos
verdadeiros. Ao contar o capuchinho vermelho por exemplo, não é
necessário falar para as crianças que elas devem obedecer aos pais,
pois se a capuchinho não fosse pela floresta não encontraria o
lobo. Vamos permitir que elas façam inferências sobre a história e
construam novos sentidos. Ao entregarmos uma interpretação ou moral
sintetizadas e prontas acabamos por assassinar inúmeras
possibilidades de interpretação.